O setor dos bens de consumo verificou um crescimento assinalável em 2023, com o valor das vendas no retalho para a indústria a aumentarem globalmente cerca de 10%, adianta o Consumer Products Report 2024 da Bain & Company. Ainda assim, metade dos executivos sentiram-se afetados pela redução dos gastos dos consumidores, que mostram cada vez mais interesse por marcas próprias mais acessíveis e por produtos sustentáveis.
Ainda que o aumento do valor das vendas no retalho seja quase o dobro da taxa média de crescimento a 10 anos, a Bain & Company alerta para o facto de três quartos (75%) desse valor estarem relacionados provavelmente com aumentos de preços e não com ganhos em volume. “Nos EUA e na Europa, as subidas nos preços foram responsáveis por 95% do crescimento do valor das vendas no retalho”, considerando que este “desequilíbrio não é sustentável e que os mercados emergentes vão ser fundamentais nos próximos anos”.
Sublinhando a dissociação generalizada entre o crescimento em preço e volume, que decorre do aumento dos custos dos fatores de produção, cerca de 82% dos mais de 120 executivos seniores de produtos de consumo inquiridos globalmente pela Bain & Company afirmaram que a inflação teve um grande impacto nos seus negócios e foi a maior dificuldade enfrentada pela maioria das equipas executivas o ano passado.
“À medida que a inflação abranda, começa a emergir um paradoxo para as empresas de consumo. Embora, por um lado, os preços tenham subido demasiado para manter os gastos dos consumidores, por outro, não subiram o suficiente para acompanhar o aumento dos custos e as crescentes pressões sentidas pelos retalhistas. O crescimento futuro vai exigir uma reformulação fundamental das propostas de valor, portefólios e modelos de negócio.”, afirmou Clara Albuquerque, sócia da Bain & Company.
Ainda que o setor tenha crescido em geral cerca de 10% em 2023, a Bain & Company estima que o crescimento médio esteve próximo de 4% num subconjunto das principais empresas de bens de consumo, naquilo que representa uma reversão de vários anos, marcados por um desempenho superior. Solicitados a pagar mais sem obter quaisquer benefícios adicionais em troca, os consumidores estão a mudar para marcas próprias mais acessíveis ou para marcas insurgentes mais premium que oferecem maior valor ao consumidor. Estão ainda a aguardar promoções ou apenas a comprar menos. E, de facto, mais de metade dos executivos inquiridos afirmaram que foram significativamente afetados pela redução dos gastos dos consumidores em 2023.
Embora as principais empresas deste setor tenham aumentado os preços em média mais de 20%, isto foi atenuado por um crescimento semelhante no custo dos produtos vendidos a partir do terceiro trimestre de 2021. “Para as empresas de topo, a margem EBIT média continua perto do nível mais baixo dos últimos 10 anos e os retalhistas têm tentado partilhar o impacto doloroso nas suas margens com as empresas de bens de consumo”, pode ler-se no comunicado da Bain & Company.
Neste sentido, a Bain & Company reforça que o regresso ao crescimento em volume vai ser fundamental. “Para muitas empresas do setor dos bens de consumo, parte da resposta envolve uma maior flexibilização nos mercados emergentes, que oferecem o maior espaço para o crescimento em volume. Os mercados emergentes foram responsáveis pela grande maioria dos ganhos em volume globais em 2023. A Índia é um exemplo notável de um crescimento equilibrado, com o valor de vendas no retalho a avançar quase 15% desde 2022, ajudado pelos consumidores que passaram dos produtos locais ou sem marca para marcas maiores e internacionais. Porém, à medida que os mercados emergentes oferecem oportunidades de crescimento, muitos deles vão exigir novas capacidades das empresas de bens de consumo.”
Vantagem para as empresas que assumirem o pelotão da frente da digitalização
A digitalização emerge como uma necessidade para as empresas e a lacuna de desempenho entre aquelas que abraçaram a transformação digital e as que ainda não o fizeram está a crescer. Assim, os líderes que se assumem digitais poderão ter vantagens em áreas-chave nos próximos anos, ao nível de pools de dados e tecnologias de IA generativa, com mais capacidade para apresentar casos voltados para o consumidor. De acordo com a Bain & Company, os ganhos poderão ser significativos, com agregação de receita e aplicações que geram eficiência de custo, e automatização de certas funções que poderão poupar até 40% do tempo de trabalho.
A oportunidade sustentável dos bens de consumo
Atualmente, metade dos consumidores globais afirmam que estariam dispostos a pagar mais – cerca de 10% – por produtos sustentáveis. Os retalhistas, por outro lado, fazem por acompanhar estas tendências, procurando fornecedores que os possam ajudar a reduzir as suas próprias emissões diretas e indiretas, à medida que as divulgações relacionadas com o clima passam para uma base mais regulamentada e obrigatória em muitos países. “Apesar deste amplo impulso, apenas cerca de um terço das empresas de bens de consumo embalados estão no caminho certo para cumprir os seus compromissos de descarbonização de âmbito 1–3” e o inquérito da Bain & Company revela “uma urgência apenas moderada nas questões ambientais, sociais e de governança (ESG)”. Embora quase 2/3 dos executivos que as citaram como prioridade estejam focados na execução dos compromissos existentes, apenas 20% disseram que seria uma prioridade em 2024.
Para João Valadares, sócio da Bain & Company, “Os vencedores em 2024 serão as empresas que tomarem medidas ousadas para redefinir as suas agendas de crescimento, ao mesmo tempo que aumentam a produtividade e capitalizam as oportunidades apresentadas pela digitalização. Embora esta seja, inegavelmente, a principal prioridade para os bens de consumo este ano, esse imperativo de curto prazo ainda deve levar a um crescimento sustentado a longo prazo. Uma abordagem equilibrada para servir todas as partes interessadas – consumidores, clientes, funcionários e o planeta – é uma forma poderosa de alcançar este duplo objetivo.”