A Sonae MC e o Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos (CCISP) assinaram, recentemente, uma parceria com o objetivo de promover o ingresso no Ensino Superior e adaptar a oferta formativa às necessidades do mercado de trabalho. Em entrevista à DISTRIBUIÇÃO HOJE, Maria Antónia Cadilhe, Head of Talent, Learning, Culture & Communication Sonae MC, explica o porquê desta iniciativa e as respetivas mais‑valias.
Portugal está perante uma galopante falta de recursos humanos qualificados em algumas áreas, realidade agravada pelos mais de 800 mil portugueses que, entre 2012 e 2017 (dados do INE), saíram do país em busca de melhores oportunidades profissionais no estrangeiro. Ao nível do ensino, em muitas situações, existe uma desadequação entre a formação dos jovens e as necessidades das empresas, que consequentemente dão origem a gaps em algumas áreas.
A Sonae MC apresenta necessidades de recrutamento concretas, identificando regularmente gaps de competências em áreas críticas dos seus negócios em crescimento, nomeadamente nas áreas da saúde, distribuição/comércio e logística e transportes.
Com esta parceria com o CCISP, a companhia pretende, segundo revelou Maria Antónia Cadilhe, Head of Talent, Learning, Culture & Communication Sonae MC, à DISTRIBUIÇÃO HOJE, “contribuir para o aumento da empregabilidade, a partir de uma oferta formativa mais alinhada com as necessidades do mercado de trabalho e, em particular, com as necessidades e gaps mais evidentes dentro das insígnias Sonae MC”.
A Sonae assinou recentemente um protocolo com o Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos (CCISP) com o objetivo de promover o ingresso no Ensino Superior e adaptar a oferta formativa às necessidades do mercado de trabalho. Quais são essas reais necessidades e exigências do mercado de trabalho nos dias de hoje?
Atualmente, em Portugal, a escassez de mão de obra é uma realidade transversal a vários setores de atividade. Esta realidade abrange não só o retalho como a construção, o turismo ou a indústria e no atual cenário macroeconómico, no qual estamos próximos de atingir um nível de pleno emprego, há um gap entre a procura e a oferta no que respeita à dinâmica do mercado de trabalho.
Enquanto líder do retalho alimentar e grande empregador privado em Portugal, a Sonae MC apresenta necessidades de recrutamento muito concretas. Temos identificadas necessidades formativas em áreas-chave, nomeadamente na saúde, distribuição e comércio, logística e transportes.
A celebração desta parceria visa promover o ingresso no Ensino Superior e contribuir para o aumento da empregabilidade, a partir de uma oferta formativa mais alinhada com as necessidades do mercado de trabalho e, em particular, com as necessidades e gaps mais evidentes dentro das insígnias Sonae MC.
Este protocolo tem assim o objetivo de impulsionar a criação de uma oferta curricular adequada, nomeadamente através da disponibilização de cursos técnicos de curta duração, mas também a partir de Licenciaturas, de Mestrados profissionalizantes ou de Pós‑Graduações.
E em que áreas é que a Sonae MC notou um maior deficit de recursos humanos? A que se deve esta realidade?
No caso específico da Sonae MC, quando analisamos esta problemática, importa que tenhamos em consideração que o nosso negócio inclui, ao dia de hoje, um nível de diversidade e transversalidade no que ao setor do retalho diz respeito, agregando a área alimentar, mas também a atividade das parafarmácias, papelarias, entre outras. Ou seja, estamos perante operações muito distintas e complexas, em que a dificuldade em recrutar se deve, igualmente e em parte, às lacunas existentes entre as qualificações que o sistema de ensino gera e o nível de necessidades que temos – em termos de quantidade e qualidade – relativamente aos recursos adequados ao desenvolvimento da nossa operação/atividade.
Esta é uma forma de preparar a empresa para os desafios futuros em termos de empregabilidade?
Temos consciência de que o ensino superior tem um papel importante no que diz respeito ao aumento das possibilidades de empregabilidade. Neste contexto, este protocolo visa preparar a Sonae MC para os desafios futuros em termos de empregabilidade, mas também permite melhorar as perspetivas dos futuros profissionais. Acreditamos que através de parcerias desta natureza, estamos também a contribuir para que as diferentes gerações tenham uma melhor qualidade de vida e que estarão mais bem preparadas para os desafios que a sociedade enfrenta atualmente e continuará a enfrentar no futuro, promovendo o sucesso escolar, a empregabilidade e a realização profissional dos jovens e de toda a população portuguesa.
Da teoria à prática
Dentro do universo Sonae MC existem insígnias com maior dificuldade de captação de competências?
Tendo em conta o contexto macroeconómico e as diferentes áreas de negócio em que opera a Sonae MC, é natural que nos deparemos com algumas dificuldades ao nível do recrutamento.
As necessidades de contratação são bastante diversas. Desde colaboradores para operações de loja e logística, não só em número, mas também com competências especializadas (por exemplo, um colaborador do talho deverá ter um know-how específico), até colaboradores com perfis mais técnicos – como optometristas, nutricionistas ou audiologistas – que se têm vindo a tornar cada vez mais escassos.
Não menos importante para nós, é conseguir atrair e reter os especialistas de áreas de expertise como big data, IT, inovação e novas tecnologias, que são, neste momento, muito requisitados pelo mercado como um todo.
A Sonae MC procura pessoas com perfis muito distintos que estejam preparadas para responder às especificidades das suas áreas de atuação: comercial, operações, marketing, logística, entre outras. Estes perfis devem partilhar uma matriz comum: os valores Sonae MC – como são exemplo a inovação, a ambição e a ética.
É sabido que existe uma desadequação entre o mundo escolar/universitário e o mundo real do trabalho/empresas. Esta é a melhor forma de preencher esse gap com recursos válidos para o mundo empresarial?
Acreditamos que existe uma oportunidade de aproximação entre estas duas realidades e que este protocolo vem contribuir exatamente para isso. Com o aumento das qualificações, as diferentes gerações terão acesso a uma qualidade de vida melhor e estarão mais preparadas para os desafios com que a sociedade se confronta e confrontará no futuro. É, por isso, essencial que se criem sinergias entre as universidades e o mundo empresarial, no sentido de ajustar a oferta formativa às necessidades reais do mercado de trabalho.
Em muitos dos recursos saídos das escolas/universidades, não existe falta de teoria. Contudo, no mundo empresarial, são as questões práticas que são uma mais-valia e acrescentam valor ao exercício da função. De que forma é que este protocolo aproxima as valências de quem sai do ensino ao mundo real das empresas?
A mais-valia reside na complementaridade das duas componentes, teórica e prática. Uma das principais premissas deste protocolo é, precisamente, promover uma maior sinergia entre a Sonae MC e o CCISP, de forma a alinhar a oferta formativa à componente mais prática do mundo empresarial. Neste âmbito, a Sonae MC e os seus profissionais, detentores de vários anos de experiência e know-how, darão assim o seu contributo para a criação de uma oferta formativa mais alinhada com esta realidade.
Estamos a caminhar, cada vez mais, para uma situação em que serão necessárias “microcompetências”?
Mais do que “microcompetências” é a capacidade de aprendizagem que representa um fator de diferenciação cada vez mais importante num mercado laboral cada vez mais qualificado e competitivo. Estarmos em constante aprendizagem e renovarmos as nossas competências ao longo da vida, assume-se assim como fundamental para o enriquecimento pessoal, independentemente da função, geração ou geografia.
Acreditamos que a digitalização também contribuirá decisivamente para a melhoria da experiência do cliente em loja, também devido à maior disponibilidade dos colaboradores, sendo que, paralelamente, o online terá um peso cada vez maior na experiência do cliente e temos de estar preparados para essa realidade. Na Sonae MC, trabalhamos diariamente no sentido de proporcionar aos nossos clientes o melhor serviço possível, não só quando visitam as nossas lojas, como em ambiente online. Neste sentido, será natural a crescente procura por profissionais especializados em vertentes do negócio que não terão tanta visibilidade por parte dos consumidores, mas que serão cada vez mais essenciais.
O fator digital
Quantos recursos poderão sair diretamente dos cursos no âmbito deste protocolo para a Sonae MC?
Neste momento, está a ser constituído um grupo de trabalho com a missão de identificar e avaliar as necessidades da Sonae MC para aumentar a capacidade de resposta ao nível da oferta formativa dos diferentes politécnicos, em todo o país. Desta colaboração resultará um conjunto de cursos de curta duração, licenciaturas e mestrados profissionalizantes, para serem submetidos a processo de registo e iniciarem o seu funcionamento, no ano letivo 2020/2021. Desta forma, e através do presente acordo, a Sonae MC compromete-se também a recrutar especialistas qualificados para as áreas críticas do seu negócio e, simultaneamente, contribuir responsavelmente para uma maior sensibilização junto da sociedade civil, em particular dos jovens e dos seus encarregados de educação, para a importância de dar continuidade aos estudos ingressando no Ensino Superior.
Segundo o último “Guia do Mercado Laboral” da Hays, em 2018, o setor do Retalho continuou muito dinâmico em termos de recrutamento, com a área digital em destaque e ainda sem dar sinais de abrandamento. É aqui que reside a maior lacuna?
Este crescimento da área digital é reflexo da evolução do mercado e das necessidades dos consumidores, que cada vez mais interagem com as marcas através destes canais e procuram fazer as suas compras através do comércio online. O crescimento do e-commerce e, paralelamente, a digitalização das empresas faz com que estas sejam áreas com grande dinamismo, para as quais existe uma grande procura de profissionais qualificados, com conhecimento e sensibilidade para compreender as necessidades dos consumidores.
O comércio no universo digital veio, também, trazer a questão relacionada com a logística e supply chain. Esse também é um desafio a que a Sonae MC está atenta?
Acreditamos que, como consequência da digitalização dos nossos negócios, serão implementadas várias soluções tecnológicas numa lógica de otimização dos espaços físicos e dos próprios recursos das lojas, não só na parte visível da experiência de compra, como também em questões de armazenamento e logística. No entanto, a partir do momento em que a loja e o processo de compra já ultrapassam o espaço físico, é possível imaginar um futuro com lojas físicas que não sejam mais do que um simples balcão de recolha. Podemos imaginar um conjunto enorme de configurações possíveis às quais não deixamos de estar atentos.
Contudo, são vários os recursos que, em vez de um salário mais alto, preferem obter outras regalias. Que planos/propostas possui a Sonae MC nesta vertente?
É um facto que, além dos salários, as empresas sentem cada vez mais a necessidade de encontrar outras estratégias para reter os seus colaboradores.
A aposta no desenvolvimento dos nossos profissionais e na sua retenção é uma das prioridades da Sonae MC, tendo investido recentemente 9 milhões de euros na formação dos colaboradores.
A Escola da Logística é um bom exemplo desta aposta, sendo um programa interno de reconhecimento, validação e certificação de competências profissionais em contexto real de trabalho. Mais do que a qualificação, apostamos também na reconversão profissional com o programa “Qualifica”.
A Sonae MC é uma das duas únicas empresas privadas em Portugal a acolher um Centro Qualifica, criado pelo Governo português, que visa aumentar o grau de escolaridade dos nossos colaboradores, bem como conferir-lhes certificações em diversas matérias. O objetivo do programa é aumentar em 5% o nível de qualificação dos colaboradores Sonae MC, com escolaridade inferior ao 12.º ano. Neste âmbito, foram já certificadas 234 pessoas, das quais 130 receberam certificação escolar e as restantes foram certificadas profissionalmente através da sua experiência.
No que diz respeito à progressão profissional, a Sonae MC criou o programa “Future Leaders @ Retail” que se destina ao público interno e externo.
Adicionalmente, é importante para nós garantir o bem-estar dos colaboradores, respondendo à tendência crescente da work-life integration. É assim que nasce o movimento “Improving Our Life” (IOL) na Sonae MC, agregando um conjunto diversificado de iniciativas que ambicionam garantir a satisfação pessoal e bem-estar nos nossos colaboradores. De entre as várias iniciativas do IOL, podemos destacar o “Clube Júnior”, que acolhe os filhos dos colaboradores durante o período de Natal e proporciona-lhes atividades como visitas ao local de trabalho dos pais, ou ateliers de cozinha e música, o programa “Colega, mudámos-te a casa”, que permitiu reabilitar a casa de alguns colaboradores, através de uma angariação de fundos promovida pelos próprios colegas, ou o “Somos Sonae”, que tem por objetivo disponibilizar apoios de caráter excecional e temporário – aconselhamento jurídico, financeiro, ajudas técnicas, bens de primeira necessidade ou outros – a colaboradores que se encontrem em situações de carência e vulnerabilidade social, entre muitos outros.
Uma das preocupações das empresas é, também, o investimento que se faz nos recursos humanos para, posteriormente, perdê-los para um eventual concorrente. Como é que se pode “combater” esta realidade?
Acreditamos que os aspetos acima referidos têm um papel fundamental na atração e retenção das pessoas, sobretudo numa altura em que se vive uma guerra pelo talento e em que as pessoas precisam de encontrar um significado e um propósito no seu trabalho, querem sentir-se felizes e realizadas.
Numa organização como a Sonae MC, este tema é uma prioridade e um desafio, porque estamos a falar de cerca de 32 500 colaboradores com realidades bastante diversas. Uma pluralidade que não se esgota nas clássicas diversidades de género ou etária, mas que se desdobra em inúmeras formas de pensar, resultado de formações académicas, interesses e expectativas variadas.