A inflação continua a moldar o panorama do retalho alimentar em Portugal, afetando tanto o comportamento dos consumidores como o desempenho do setor.
De acordo com um estudo dos Scantrends da Nielsen, em 2024, foram gastos 14.715 milhões de euros nos hiper e supermercados em Portugal, o que representou um aumento de 4,6% face ao ano anterior. Apesar deste valor se traduzir num abrandamento da taxa de crescimento, que refletiu a trajetória da inflação ao longo do ano passado, correspondeu a um aumento de 649 milhões de euros, explica a análise.
Segundo os dados partilhados pela Jerónimo Martins, a inflação alimentar em Portugal foi de 2,4% em 2024, atingindo 3% no quarto trimestre, com a retalhista a avançar, no relatório de apresentação de contas, que no mercado de retalho alimentar, os consumidores mantiveram-se “muito focados em aproveitar oportunidades de preço e promoções”.
A inflação também afetou os hábitos alimentares dos portugueses, com uma investigação realizada pela Edenred a indicar que 90% dos inquiridos prestaram mais atenção ao equilíbrio das suas refeições e 51% mudaram os seus hábitos alimentares para comer de forma mais saudável. No entanto, 97% admitiu que, se os preços dos alimentos continuarem a subir, vão ter de limitar o acesso a uma alimentação mais saudável.
Já o relatório “Global Retail Outlook 2024” da Deloitte apontou que, apesar das incertezas económicas e da inflação, os retalhistas mantiveram uma perspetiva otimista, impulsionada pelo potencial da tecnologia, especialmente da Inteligência Artificial (IA), para melhorar operações e a experiência de cliente.
Para perceber como o setor está a responder à pressão da inflação, a DISTRIBUIÇÃO HOJE conversou com Daniel da Silva, Managing Director Procurement da ALDI Portugal, que nos revelou de que forma o modelo de negócio baseado em marcas próprias tem sido crucial para manter uma oferta ajustada no que toca ao preço.
Entre estratégias de eficiência operacional e uma nova campanha de reduções permanentes em produtos essenciais, a insígnia acredita que é possível responder às exigências dos consumidores mesmo num contexto de inflação prolongada.

Daniel da Silva, Managing Director Procurement da ALDI Portugal
A inflação tem sido um fator desafiador para o setor do retalho. Quais são as principais estratégias que implementaram para ajustar os preços sem perder competitividade?
A principal estratégia é mantermo-nos fiéis ao nosso ADN, sendo que, como verdadeiro discounter, assentamos o nosso modelo de negócio na oferta de marcas próprias exclusivas. Atualmente, na ALDI Portugal, o nosso sortido é composto por 85% de marcas próprias, o que nos permite não só assegurar a mais elevada qualidade ao preço mais baixo possível, como também maior competitividade. Para conseguirmos oferecer preços baixos de forma contínua, focamo-nos em alcançar a maior eficiência possível ao longo de todas as nossas operações, aplicando todas as reduções de custos nos preços de venda finais apresentados aos nossos clientes.
No entanto, e apesar da nossa filosofia ser “every day low price”, existem outras ações ou campanhas estratégicas que vamos implementando ao longo do ano, muito focadas no cabaz de bens essenciais, com o objetivo de conseguirmos garantir mais oportunidades de poupança às famílias, em linha com aquelas que são as suas maiores necessidades.
Como a inflação tem influenciado o comportamento de compra dos consumidores? O que procuram?
Aliado à procura e foco naqueles que são os bens essenciais do dia-a-dia, o preço continua a ser um fator crucial para os consumidores. Estes continuam preocupados com o seu orçamento e procuram alternativas acessíveis, mas que não comprometam a diversidade ou a qualidade. Neste sentido, as marcas próprias têm vindo a ser cada vez mais encaradas como uma opção, pelo facto de os consumidores não só estarem mais recetivos à sua compra e experimentação, mas também por reconhecerem a sua qualidade aliada a um preço atrativo.
Assim, na ALDI, continuamos a melhorar a nossa oferta, investindo no nosso sortido, principalmente nas nossas marcas próprias, que têm, inclusive, vindo a ser distinguidas pelos consumidores portugueses, após experimentarem e compararem com outras concorrentes. Além de estarmos continuamente atentos àquelas que são as tendências do mercado, procuramos de igual forma assegurar que os nossos produtos e marcas apresentam os mais elevados padrões de qualidade.
Existe uma tendência para promoções de forma mais frequente para compensar os aumentos de preço?
Tal como referido acima, a nossa filosofia é “every day low price” e, por isso, temos como objetivo apresentar preços sempre baixos, mesmo em contextos mais desafiantes. No entanto, para que a nossa oferta seja sempre relevante e eficaz, é crucial fazermos uma revisão e reavaliação constante das nossas estratégias promocionais, garantindo o alinhamento com o comportamento de compra dos consumidores e com as suas necessidades de poupança.
Avançaram com mudanças na variedade de produtos disponíveis para se adaptarem a um contexto económico mais frágil?
Enquanto discounter, o nosso foco é garantir a mais elevada qualidade dos nossos produtos, aliada ao melhor preço do mercado. Mesmo em contextos económicos mais frágeis, nunca fazemos nenhuma alteração à nossa oferta que implique diminuir os nossos padrões de qualidade. Procuramos sempre apresentar o preço mais baixo para a qualidade apresentada, sendo que a diminuição do preço não se reflete numa menor qualidade do produto ou na sua variedade.
Têm alguma nova campanha/ação pensada para este ano relacionada com ajustes nos preços dos vossos produtos?
Com o objetivo de garantir que os nossos clientes conseguem poupar ainda mais e de forma contínua, sem abdicarem da qualidade ou diversidade, iniciámos o ano com aquele que é o nosso compromisso para 2025: “Preços baixos para sempre”. Assim, desde janeiro que estamos a reduzir permanentemente o preço de vários produtos essenciais selecionados. Todas as semanas, na sua visita às nossas lojas, os clientes encontram novos e mais produtos com esta redução de preço, que se somam aos da semana anterior, em categorias como carne, peixe, lacticínios, congelados, padaria, pequeno-almoço, conveniência refrigerada, despensa, bebidas não alcoólicas e lanche.
Contrariando a duração limitada das promoções e saldos característicos da época, esta é uma oportunidade de poupança reforçada em produtos que fazem parte da alimentação diária das famílias, abrangendo também categorias que pesam mais no orçamento das mesmas, como a carne e os congelados, que, inclusivamente, têm estado sempre em destaque.
Como olham para o futuro do retalho em Portugal nos próximos meses, considerando um cenário de inflação prolongada?
Num cenário de inflação prolongada, o setor do retalho em Portugal enfrentará diversos desafios que exigirão adaptações estratégicas para manter a competitividade e a sustentabilidade a longo prazo. A inflação elevada reduz, como sabemos, o poder de compra dos consumidores, levando-os a procurar alternativas mais económicas e a ajustar os seus hábitos de consumo. Esta mudança pode originar uma procura maior e constante por marcas próprias.