Com o comércio de proximidade a registar um crescimento de cerca de 20%, fica confirmado que não foi somente o e-commerce que evoluiu durante os últimos tempos. Para compreender melhor este desenvolvimento e o reforço do posicionamento do canal de proximidade no setor da distribuição, a DISTRIBUIÇÃO HOJE falou com Cristina Mesquita, diretora-geral da Euromadi Portugal, central de negociação e serviços integrada no grupo Euromadi e que, em Portugal conta com mais de 30 associados, agregando 43 Cash&Carry e mais de 2.000 lojas de comércio de proximidade.
Portugal vive, desde o dia 2 de março, sob a “nuvem” da pandemia de COVID-19. Com ela, vieram restrições à circulação de pessoas, novos hábitos e comportamentos de consumo e compras dos portugueses. Por norma, aponta-se muito o crescimento exponencial do e-commerce, esquecendo-se o papel fundamental que o comércio de proximidade teve ao longo destes meses. Quais foram os principais desafios que este comércio de proximidade teve de enfrentar e que papel desempenhou nestes meses?
O surgimento e agravamento da pandemia da COVID-19 trouxeram inúmeros desafios ao setor do retalho alimentar, que se viu confrontado com a inevitável mudança nos hábitos e tendências de consumo e com a emergência de novas necessidades por parte do consumidor.
A par do e-commerce, também o comércio de proximidade desempenhou um papel fundamental durante a crise, devido, entre outras características, à facilidade de acesso. Desde logo o principal desafio foi a organização das equipas de forma a manter o funcionamento das empresas, mas garantindo a segurança de todos, num sector que esteve sempre a operar. Neste contexto cada um dos nossos associados desenvolveu a estratégia mais adequada à sua realidade no terreno. O principal desafio prendeu-se certamente com o aumento da procura, que levou a uma necessária adaptação e reinvenção do negócio, através de uma série de estratégias facilitadoras que permitiram garantir a vantagem competitiva do comércio de proximidade e assegurar uma oferta completa dos seus serviços em contexto de crise.
Os dados mais recentes apontam para um crescimento das vendas de 20% no comércio de proximidade face a período homólogo. Houve aqui um disputar entre o e-commerce e o comércio de proximidade?
Devido ao medo generalizado nos primeiros meses da pandemia no país, os consumidores começaram a dar primazia aos locais de compra mais próximos da sua residência. Desta forma, o comércio de proximidade esteve à altura do desafio e soube dar resposta, adotando desde cedo uma série de estratégias para assegurar a disponibilidade dos bens essenciais.
A confiança, a segurança, a comodidade, a rapidez e o serviço personalizado que o comércio de proximidade ofereceu aos seus clientes, ao longo destes meses, permitiu que este passasse a ser a primeira escolha de muitos consumidores para realizar as suas compras, o que posteriormente levou a um crescimento sustentado ao nível de vendas e a um reforço da relação entre o consumidor e este tipo de canal.
Uma proximidade digital
O comércio de proximidade também se digitalizou? De que forma e com que resultado?
A digitalização foi parte integrante da necessária reinvenção do comércio de proximidade mediante a pandemia. Foram disponibilizados e reforçados novos serviços, como é o caso das encomendas online e através das diversas redes sociais que permitiram um contacto próximo com o consumidor. O recurso a estes novos serviços permitiu que o comércio de proximidade garantisse um acesso fácil, cómodo e rápido aos produtos essenciais para toda a gente.
Neste sentido, o reforço da digitalização será um grande aliado na adaptação à pandemia de COVID-19, permitindo assegurar uma ótima experiência do cliente. Os associados da Euromadi Portugal têm atualmente diversos projetos em curso o que, reforçando o serviço personalizado e de confiança característico do comércio de proximidade, se refletirá no aumento da sua relevância e preferência.
Com o desconfinamento, o consumidor voltará aos comportamentos e hábitos anteriores? Ou seja, voltará a realizar as compras como fazia no período pré-COVID ou este protagonismo do comércio de proximidade é sustentável no tempo?
Neste contexto de pandemia, os hábitos de compra por parte dos consumidores alteraram-se, mas as suas prioridades não mudaram, a importância do preço, os frescos, produtos sustentáveis e outros mantiveram-se. Tendo em conta os níveis de satisfação, a experiência de compra positiva e os índices de confiança experienciados pelo consumidor no comércio de proximidade, acredito que, após o desconfinamento, os consumidores vão continuar a valorizar as vantagens e comodidade do comércio de proximidade.
Foram apontadas novas necessidades por parte do consumidor. Que necessidades foram ou são essas e que adaptações e reorganizações foi necessário fazer por parte do comércio de proximidade?
De modo geral, verificou-se uma alteração no comportamento do consumidor na hora da compra, a par do surgimento de novas necessidades. As questões de segurança alimentar e higiene tornaram-se uma prioridade, tal como a já habitual importância do preço (agravada pela atual situação económica mais fragilizada), maior procura pelos frescos e a crescente preocupação por um consumo mais sustentável.
Assim sendo, numa primeira instância, foi necessário adaptar o espaço, adotando as normas da DGS, tais como a lotação reduzida, disponibilização de desinfetante e marcas para garantir o distanciamento social, entre outras medidas, de forma a assegurar uma visita segura e cómoda. No que diz respeito ao preço, o comércio de proximidade pratica preços, igualmente, competitivos e muitas vezes iguais ou inferiores a outros canais de distribuição.
Para além disso, verificou-se também que os consumidores passaram a preferir deslocar-se menos vezes e comprar mais em cada visita. Deste modo, para além da evidente vantagem da proximidade do local de residência, o comércio de proximidade também demonstrou estar preparado para as grandes compras, bem como para compras do dia-a-dia como os produtos frescos, que se manteve uma tendência neste contexto de crise.
Na Euromadi Portugal procurámos apoiar os nossos associados, garantindo que a cadeia de distribuição continuasse a funcionar de forma a assegurar a normalidade na prestação dos serviços e satisfazer o aumento da procura por parte dos consumidores.
Uma proximidade local
O facto de existir uma maior relação entre o comércio de proximidade e a produção local funcionou como um ponto a favor?
Sim. Há muito tempo que o comércio de proximidade recorre aos produtores locais, nomeadamente em algumas categorias, como os produtos frescos, para o abastecimento das lojas. Esta prática teve muita importância neste período, uma vez que, permitiu não só evitar ruturas de stock, nas lojas, em tempos de açambarcamento, como também permitiu apoiar a economia local. Os pequenos produtores também tiveram uma fase difícil, devido ao encerramento de restaurantes, hotéis e mercados locais que abasteciam anteriormente. Neste sentido, o apoio a estes produtores por parte do comércio de proximidade constitui uma mais valia e uma vantagem a vários níveis, resultando numa relação de win-win.
Foi isso que também tornou o comércio de proximidade mais ágil e móvel, principalmente, nos frescos?
O recurso à produção local por parte do comércio de proximidade, permite que consigam fazer chegar aos consumidores os produtos agrícolas mais frescos e de maior qualidade diariamente. O comércio de proximidade consegue, assim, juntar o melhor de dois mundos, por um lado a segurança, a comodidade e a rapidez da compra, por outro a oferta de produtos frescos, que são a preferência dos consumidores.
No abastecimento de refrigerados e congelados a Euromadi Portugal proporciona aos seus associados o serviço EuromadiLogis criado com o objetivo de tornar a logística destes produtos mais eficiente, conseguindo garantir o abastecimento célere e eficaz durante todo este período, tendo representado por isso um papel muito importante no abastecimento dos Cash&Carry dos nossos associados
A Euromadi Portugal, enquanto central de compras, abastece o comércio de proximidade de norte a sul do país. Dentro do território nacional há lugar a destaques por região ou categorias de produtos?
Importa salientar que a Euromadi Portugal é uma central de negociação e serviços, que atua no mercado nacional desde 2006. Um dos nossos principais objetivos é proporcionar aos nossos associados condições para se manterem numa trajetória de crescente competitividade.
Como central de negociação e serviços, o que podemos confirmar, é que desde que a COVID-19 foi considerada como pandemia, os bens de Grande Consumo em Portugal cresceram 15% versus o período homólogo, com especial impacto nos bens alimentares básicos de longa duração e nos produtos de higiene e limpeza (Barómetro Nielsen Covid-19, da semana 9 a 20). Não assistimos a grandes diferenças regionais numa fase inicial, mas estamos expectantes sobre o impacto que a previsível diminuição do turismo pode vir a trazer nas diversas regiões.
A Euromadi Portugal faz, igualmente, parte da EMD. É possível fazer uma comparação entre a realidade vivida em Portugal e os outros países que fazem parte dessa central de produtos de grande consumo?
O Grupo Euromadi é membro fundador da Central European Marketing Distribution (EMD), a maior central de produtos de grande consumo da Europa e líder na distribuição, presente em 20 países. Pela análise dos dados recebidos podemos referir que a comparação das dinâmicas de consumo em diferentes países, estão intrinsecamente ligados aos diferentes impactos e fases em que se encontram relativamente à da COVID-19 e respostas à mesma.
Em Portugal, Espanha, Itália e França o pico das vendas situou-se na semana 11, com incrementos menores comparativamente ao período homólogo após essa data. A situação no Reino Unido, por exemplo mostra um pico do consumo na semana 12 (Barómetro Nielsen Covid-19, semana 14). As tendências de crescimento de consumo em determinadas categorias de produtos ou armazenamento, ocorreram em todos os países, mas em diferentes semanas, de acordo com as reações mais tardias a esta pandemia.
Fala-se muito de uma possível 2.ª vaga do surto. Como é que o comércio de proximidade se poderá preparar ainda melhor para essa realidade?
Uma vez que se trata de uma situação sem precedentes, a adaptação à pandemia foi gradual e mantém-se constante. Ainda assim, acreditamos que o comércio de proximidade está agora mais preparado do que nunca para enfrentar uma nova vaga, tendo já demonstrado a sua capacidade de resiliência e adaptação. A missão da Euromadi Portugal passa por facilitar e fornecer aos seus associados todos os mecanismos necessários para alavancar a sua vantagem competitiva, para que possam manter a sua trajetória de crescimento e prosperar, mesmo em situações adversas.