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Produção

“É importante que as embalagens sejam projetadas para serem reutilizáveis, recicláveis ou compostáveis”

Pedro Dinis, responsável pelo Projeto S4Agro, projeto que tenta encontrar soluções inovadores e sustentáveis para o setor agroindustrial em termos de embalagem, esteve em entrevista à DISTRIBUIÇÃO HOJE, num artigo publicado na nossa versão impressa.

No presente artigo, publicamos a entrevista na íntegra, com o especialista a abordar as principais questões em termos do que é a investigação relativamente à embalagem, mas também sobre como serão as embalagens do futuro.

 

Leia, em baixo, as resposta de Pedro Dinis.


O projeto S4Agro tem vindo a desenvolver investigação no âmbito da embalagem. Explique-nos um pouco melhor o trabalho que têm vindo a desenvolver.

 

O projeto S4agro encontra-se a ser desenvolvido pela Universidade da Beira Interior, em parceria com a Universidade de Évora, o Instituto Politécnico de Coimbra, o Instituto Politécnico da Guarda, Instituto Politécnico de Leiria, e o Instituto Politécnico de Viana do Castelo e a InovCluster – Associação do Cluster Agroindustrial do Centro, cofinanciado pelo Portugal2020 e pela União Europeia através do FEDER. Este projeto tem como objetivo qualificar as pequenas e médias empresas (PMEs) do setor agroindustrial, nomeadamente das fileiras dos produtos cárneos, hortofrutícolas, lácteos e de padaria, para a adoção de soluções inovadoras e sustentáveis, que permitam aumentar a sua produtividade, eficácia e eficiência ao nível da indústria 4.0 e economia circular. Nesse sentido, o projeto focou-se na identificação e disseminação de boas práticas de embalagens primárias, secundárias e inteligentes no setor agroindustrial, além de abordar questões de cibersegurança, redução de desperdícios e inovação nas PMEs do setor.

As embalagens desempenham um papel crucial no transporte, armazenamento e comercialização de produtos agroalimentares. Nos últimos anos, a investigação em embalagens tem-se concentrado na melhoria da proteção e preservação dos produtos, bem como na redução do desperdício de alimentos.

 

Algumas das tecnologias e materiais que estão a ser estudados e utilizados na indústria de embalagens incluem filmes plásticos inteligentes que alteram a permeabilidade ao oxigénio, dióxido de carbono e humidade para prolongar a vida útil dos produtos armazenados; embalagens com camadas de barreira para proteger contra contaminação e deterioração; e embalagens compostáveis e biodegradáveis que podem ser decompostas em ambientes controlados ou em aterros sanitários.

Trabalham as embalagens em vários âmbitos, desde a embalagem primária, embalagem secundária e embalagem ativa. Como tem corrido esse trabalho e quais as conclusões a que chegaram?

 

Para todos os tipos de embalagens (primárias, secundárias e embalagem ativa ou inteligente) foram desenvolvidos benchmarkings internacional para identificação de tecnologias. Com os dados obtidos, e em particular para as embalagens primárias, o estudo permitiu Identificar e disseminar junto das PME do setor, boas práticas na utilização de embalagens primárias sustentáveis (ecológicas). Do mesmo modo pretendeu-se identificar os fatores críticos para a aplicação de embalagens sustentáveis nas PME nacionais do setor agroalimentar, que potencie a sua progressão na cadeia de valor por via da qualificação da oferta, assim como pela preparação para o cumprimento de regulamentos futuros que venham a colocar restrições ao nível do impacto ambiental das embalagens.

Já nas embalagens secundárias, foram identificados os fatores críticos para a eficiência logística e no transporte de produtos agroalimentares. Foi produzido um estudo de boas práticas em utilização de embalagens secundárias sustentáveis (recicláveis e/ou reutilizáveis) e das práticas logísticas mais eficazes por cada setor em estudo da indústria agroalimentar.

Para as embalagens inteligentes e/ou ativas, foram Identificadas e disseminadas junto das PME do setor as tecnologias inovadoras e boas práticas em utilização.

A variedade de resultados foi tão alargada que seria muito extenso descreve-los. Pode-se indicar que o setor agroindustrial está ciente, e tem progredido nas alterações que são necessárias realizar no âmbito das embalagens para redução de impactes ambientais e extensão de vida útil visando a redução do desperdício, mas ainda há um longo caminho a percorrer, desde a sensibilização dos produtos, aos distribuidores, consumidores finais e governantes. Todos os resultados do projeto encontram-se disponíveis na página www.s4agro.pt.

Na análise que conseguem fazer, as empresas portuguesas, face ao benckmark internacional, estão em linha com o que de melhor se faz lá fora?

Em termos gerais, sim. No âmbito da embalagem primária, e muito pelas exigências normativas para tal, a agroindústria tomou as medidas necessárias num caminho da sustentabilidade. No caso das embalagens secundárias há um trabalho de sensibilização para profundo a fazer. A análise do ciclo de vida é um ponto fundamental para comparar os impactes ambientais de embalagens recicláveis de uma única utilização e de embalagens robustas e reutilizáveis, mesmo que sendo estas últimas construídas com materiais com menor reciclabilidade. No caso das embalagens ativas e inteligentes há um longo percurso para a massificação destas tecnologias nas prateleiras, muito devido ao custo de incorporam, ainda mais salientado quando se fala de uma embalagem de utilização única.

A procura de novos materiais para embalagem é um dos vetores mais explorados. Estamos próximos de encontrar melhores soluções neste âmbito?

Tem havido um desenvolvimento científico e tecnológico muito grande nesta vertente. Todos os dias são propostos novas combinações de materiais de diferentes tipos, com vantagens para o produto, em termos de segurança e proteção, e para o ambiente.

Também em termos logísticos, para transporte, é preciso pensar a embalagem. Há já esta perceção também por parte das empresas produtoras?

Sim, as empresas tem noção que a embalagem tem que ser repensada em termos logístico, desde a sua geometria para redução de espaços vazios, como pela inclusão de sistemas de rastreabilidade, soluções de monitorização aliadas às comunicações sem fios, vulgo Internet of Things (IoT), que permitam em tempo real ter uma perceção das condições de conservação dos produtos, para além da sua localização. Este conhecimento permitirá ao produtor, ao distribuidor, ao retalhista, proceder a alterações da venda em função da qualidade estimada do produto, sempre com a perspetiva de conseguir colocá-lo à venda no máximo expoente de qualidade, minimizando o desperdício alimentar.

A melhor embalagem será a não embalagem. Estamos preparados para esta transição ou ainda estamos muito dependente dos produtos embalados?

Por questões de segurança alimentar que de a indústria não se poderá alienar, o embalamento do produto está ainda muito enraizado. Porém, o desenvolvimento dos materiais tem vindo a permitir a redução da espessura do material (micragem) o que tem impacte positivo. Por outro, soluções inovadoras de películas protetoras, que poderão ser edíveis, também têm vindo a ser desenvolvidas.

Com uma forte preocupação ambiental em todos os setores da sociedade, de que forma a redução da pegada poluente das embalagens pode ser também um vetor para ajudar ao sucesso neste âmbito?

A redução da pegada poluente das embalagens pode ser um vetor importante para ajudar no sucesso da preocupação ambiental, pois as embalagens são um dos principais geradores de resíduos sólidos urbanos e um grande contribuinte para a poluição do solo, da água e do ar. Ao reduzir o impacte ambiental das embalagens, é possível minimizar a quantidade de resíduos gerados e reduzir a poluição associada a esse processo. Pode passar pela utilização de materiais mais sustentáveis e recicláveis, como plásticos biodegradáveis, papel e cartão reciclado, ou materiais compostáveis. Também é importante que as embalagens sejam projetadas para serem reutilizáveis, recicláveis ou compostáveis, de modo a maximizar o seu ciclo de vida e minimizar o seu impacte ambiental. Além disso, a redução do desperdício alimentar também pode ser alcançada através de embalagens adequadas que ajudem a preservar os alimentos por mais tempo, evitando a sua deterioração e reduzindo a necessidade de descarte precoce. Esta condição pode auxiliar na minimização da produção de resíduos e a poluição associada a essa produção.

Com um tecido empresarial de pequenas e médias empresas, com capacidade limitada para I&D, a ligação à Academia pode ser a chave para se conseguir inovar?

Sim, a ligação à Academia é fundamental para PMEs que têm capacidade limitada para I&D. As instituições académicas, como as Universidades, Institutos Politécnicos e Institutos de Investigação, têm recursos que podem ajudar as PMEs a inovar, seja pelos seus recursos humanos especializados, pelos equipamentos de vanguarda, e acesso a financiamento para investigação e desenvolvimento. Além disso, as instituições académicas podem ser o veículo de qualificação que ajudam as PMEs a adquirir novos conhecimentos e as competências necessárias para a inovação. Através da colaboração com a Academia, as PMEs podem ter acesso a novas ideias, tecnologias e métodos de produção que lhes permitam desenvolver novos produtos e processos, melhorar a qualidade e eficiência da produção e aumentar a sua competitividade no mercado. Por outro lado, a colaboração com a academia também pode ajudar as PMEs a estabelecer parcerias com outras empresas, organizações governamentais e instituições de investigação, nacional e internacionalmente, promovendo a partilha de conhecimento e recursos. Estas parcerias podem levar a oportunidades de negócios inovadores, novos mercados e aumento da visibilidade da empresa. Em resumo, a ligação à Academia é sem sombra de dúvida um fator crítico para o sucesso das PMEs na inovação e competitividade.

Neste âmbito, seria possível dar-nos um evento que tenham desenvolvido com alguma empresa de âmbito nacional?

No âmbito do projeto S4Agro, foi realizado um Congresso Internacional S4agro 2023, que decorreu 2 a 3 Março’23 em Castelo Branco. Tratou-se de um evento internacional técnico e científico, dedicado às ciências e tecnologias alimentar, para por em contacto investigadores, PME da fileira do setor agroindustrial, profissionais e estudantes, governantes, de modo a compartilhar, consciencializar e sensibilizar para os últimos avanços no conhecimento científico atual com relevância industrial e novos desenvolvimentos da ciência alimentar e tecnologias emergentes, dedicados à sustentabilidade do sector agroindustrial.

No âmbito do projeto S4Agro, teve palco no Congresso um Concurso, composto por duas fases. Primeiramente foi dirigido às empresas do setor agroalimentar, para proporem desafios à academia, visando melhorar a sua sustentabilidade e os seus processos de inovação. Numa segunda fase, equipas de investigação da academia responderam aos desafios e identificaram as melhores soluções para tornar PMEs mais sustentáveis, produtivas e eficientes. Este foi o mote para distinguir empresas e investigadores que tentam contribuir para a inovação no setor agroindustrial, fomentando a aproximação das empresas à academia.

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