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Produção

“Muitas pessoas não se dão conta que o setor de produção de comida e bebida é o maior empreendedor da Europa”

D.R.

Dirk Jacobs, diretor geral da FoodDrinkEurope, esteve esta segunda-feira presente no 9.º Congresso da FIPA, evento que decorreu no Centro de Congressos de Lisboa. Na sua intervenção, este responsável abordou a importância de maior investimento no setor e de uma voz mais ativa de todos os intervenientes na fileira do agroalimentar.

Numa intervenção ainda durante o período da manhã, o keynote do evento, lembrou “porque é tão importante olhar para a agenda europeia, mas também porque a colaboração entre o nível nacional, o nível português e o de Bruxelas é tão importante.”

 

Representando 25 federações de comida e bebida nacionais, como o FIPA, o diretor geral do organismo europeu endereçou alguns dos desafios que o setor tem vindo a enfrentar nomeadamente ao nível taxação.

“[Os desafios] são comuns e compartilhados em todos os Estados Membros Europeus e, por isso, é muito útil ver como outros países estão a lidar com esses problemas. Também temos setores de quase todas as categorias de comida e bebida da indústria de comida e bebida. Então, desde ingredientes de cozinha a café, a cerveja, a bebida, há muitos desafios e soluções comuns que podem ser partilhados em várias categorias.”

 

Neste âmbito, Jacobs referiu que a indústria agroalimentar europeia oferece, todos os dias, 1,5 bilhão de refeições aos consumidores, pelo que este não deve ser um setor subestimado. “(…) Nós somos o maior setor produtivo na Europa. Nós somos maiores do que a indústria de automóvel ou do que a indústria farmacêutica em termos de turnover, com quase mais de 1 trilião de euros por ano em turnover, mas também em emprego, e acho que muitas pessoas não se dão conta que o setor de produção de comida e bebida é o maior empreendedor da Europa.”

Fazendo depois um paralelo em termos da dispersão das empresas produtoras de alimentos e bebidas em Portugal e na Europa, Jacobs referiu que esta é “uma indústria muito fragmentada, onde há 291 mil empresas em toda a Europa, trabalhando em processamento e no fabrico de alimentos e frutas”, referindo ainda ser um dos setores que mais ‘investimento’ recebe do consumidor.

 

“Não vou preocupar-me muito em dar-vos outros números, mas acho interessante que aqui em Portugal 27% do orçamento familiar vai para comida e bebida. Isso é relativamente alto se compararmos com outros países na União Europeia, mas não é o máximo, a Grécia tem 30%”, sublinhou.

Lembrando que significa que quase ¼ das despesas que as pessoas fazem mensalmente vão para comida e bebida, o responsável máximo da FoodDrinkEurope lembrou que é também importante verificar que este é um tema que também tem ramificações em medidas fiscais, taxação, garantindo, por isso, estar empenhado em fazer com que os produtos agroalimentares sejam acessíveis a todos os consumidores.

 

Enfatizando que Portugal conta com cerca de 11 mil empresas [no setor agroalimentar], Jacobs sublinhou que o setor “é uma parte importante da economia”, referindo, contudo, que apesar desse elevado número “nos mercados internacionais, especialmente no mercado de alimentos e bebidas, estamos a ver que o mercado ainda está muito em progressão”. É, por isso, importante verificar para onde exportamos os nossos produtos. “Os produtos europeus são conhecidos pela qualidade, pela sua segurança, pela sua sustentabilidade e eles vão para todos os lugares”.

Referindo-se, depois, à realidade norte-americana, Dirk Jacobs, referiu que se “os Estados Unidos são o nosso parceiro de exportação número um, nós somos, na verdade, o maior exportador de comida e bebida do mundo.”

“Isso também mostra a importância internacional do nosso setor. E, claro, não nos esqueçamos que temos o Reino Unido, que é o nosso país de exportação maior, mas se olharmos para fora da Europa, são os Estados Unidos”, alertando, contudo, para as dificuldades sentidas nos últimos anos com o eclodir do conflito armado na Ucrânia.

“[A guerra na Ucrânia] mostrou a nossa vulnerabilidade, porque nós vimos durante o começo da guerra na Ucrânia como éramos dependentes do óleo de girassol. Esse produto vem de dois países: a Ucrânia e a Rússia.”

A importância do ‘lobby’ legislativo

“Eu tento sempre garantir que os legisladoras entendam que comida e bebida não é apenas um setor que pode ser comparado com outros setores económicos, nós somos uma necessidade absoluta para a saúde e para a vida”, começou por referir Jacobs, lembrando que “também somos um dos poucos setores económicos que estão localizados principalmente nas áreas rurais dos países”.

O responsável da FoodDrinkEurope defendeu, então, que o setor agroalimentar é “o DNA rural dos Estados Membros da União Europeia”, acrescentando que do ponto de vista geopolítico, “comida e bebida tornaram-se muito mais estratégicas”. “Veja-se o que a China fez em retaliação à regulamentação do mercado de veículos elétricos que foi proposto pela União Europeia. Começou a retaliar através de um corte nas compras de carne de porco e champanhe e assim por diante.”

“Nós acreditamos que para que as sociedades funcionem e sejam estáveis, precisamos ter comida e bebida em casa. Nós vimos isso durante os momentos de crise, durante a pandemia do Covid, quando as fronteiras foram fechadas”, lembrou.

Defendendo que precisamos de pensar no agroalimentar como “uma infraestrutura crítica”, Jacobs lembrou que os desafios internacionais e a incerteza geopolítica são pontos a que devemos estar atentos, isto porque o conflito em Gaza ou uma ‘guerra’ entre Estados Unidos e China poderá aumentar custos logísticos, por exemplo.

“Em 2050, mais de 65% da população na Europa terá mais de 65 anos. Então teremos uma população diferente e teremos de lidar com isso, teremos uma população que terá diferentes necessidades alimentares, o que pode ser uma oportunidade também, claro”, rematou sobre este ponto.

Os custos ‘cegos’ e a falta de investimento

Dirk Jacobs, abordou ainda uma outra temática, desta feita reforçando que o preço da energia na Europa é muito mais elevado que, por exemplo, nos Estados Unidos, o que torna os preços europeus menos competitivos.

“Em termos de preços de energia, a Europa tem, em média, preços de energia oito vezes mais altos que os EUA. 8 vezes mais. Então, se eu disser que 70% a 80% do custo de produção é energia, podemos perceber o quanto de desvantagem nós temos”, começou por referir.

Criticando, depois, a falta de investimento em investigação e desenvolvimento, Jacobs, lembrou que “países como Japão e, novamente, os Estados Unidos estão a fazer muito melhor. E parte disso também tem a ver com o padrão regulador, neste mercados podem adotar-se inovações com uma velocidade muito rápida, há colaboração pública e privada e assim por diante”.

Na fase final da sua intervenção, o diretor geral da organização que representa mais de 25 associações agroalimentares na Europa, deixou uma pergunta à audiência “Como queremos ser enquanto setor no futuro? E como podemos ser resilientes?”

“Eu mencionei que não tivemos desastres ou problemas maiores durante a Covid ou durante a guerra [na Ucrânia]. Mas há muita vulnerabilidade no sistema. Como podemos tornar-nos competitivos?”

Defendendo que a transição sustentável pode ser a chave, Jacobs recordou que para essa transição serão precisos “uns 37 a 52 bilhões de euros”. As políticas da União Europeia, exceto a Política Agrícola Comum (PAC), não tem budget. Então, a estratégia de farm to fork que todos nós estamos a seguir, não tem nenhum budget. Isso precisa mudar no futuro próximo, porque precisamos desse dinheiro para investimentos em agricultura regenerativa, investimentos em energia renovável, infraestruturas circulares, reciclagem e assim por diante.”

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