Nas últimas semanas, sobretudo desde a entrada em funções da nova presidência dos Estados Unidos, assistimos a uma nova fase de incerteza no comércio global. A tentar redefinir a sua diplomacia comercial, a nova administração norte-americana tem recorrido à imposição de tarifas como ferramenta de pressão sobre os parceiros que não se alinham com a sua visão, ameaçando uma guerra de imposição de custos acrescidos sobre aqueles que não se curvarem ao seu poder económico.
A China, potência consolidada e epicentro da produção global em diversos setores, tem acompanhado esta evolução sem sinais de grande preocupação. Consciente da sua posição estratégica como peça-chave no comércio mundial, o impacto das tarifas impostas pelos EUA tem sido, até agora, limitado no seu crescimento económico. A economia chinesa, pela sua escala e influência, parece absorver as tensões comerciais sem grandes oscilações, tal como acontece com a maioria dos acontecimentos que abalam a economia global.
Já a Europa, pressionada por desafios internos e pela instabilidade da guerra no Leste, tem respondido com uma diplomacia cautelosa. Sem ameaçar diretamente a estratégia protecionista dos EUA, e sem uma voz única capaz de definir um posicionamento forte, a resposta do Velho Continente tem sido pautada mais pela negociação e cedência do que pela retaliação.
Numa guerra de blocos económicos, no entanto, os números não podem ser ignorados. A globalização criou uma rede de interdependência entre os Estados Unidos, a China e a Europa. Os EUA são a economia que mais bens importa, enquanto a China representa cerca de 20% das importações da União Europeia. Por outro lado, os Estados Unidos continuam a ser o maior destino das exportações europeias. Em 2023, as exportações de bens da UE para os EUA totalizaram 502,3 mil milhões de euros, enquanto as importações da UE provenientes dos EUA chegaram a 346,5 mil milhões de euros, reforçando a importância desta relação comercial.
Estes números evidenciam que, apesar das tentativas dos EUA de reforçar a sua posição através de tarifas e medidas protecionistas, a sua economia continua altamente dependente dos seus parceiros comerciais – tanto quanto estes dependem dela.
Neste contexto previsível, a China continua a consolidar-se como potência industrial dominante, enquanto a Europa, muitas vezes dividida nas suas respostas, procura equilibrar os seus interesses sem se tornar refém de nenhuma das partes, embora inevitavelmente dependa de ambas.
O verdadeiro desafio para a nova administração norte-americana será encontrar um equilíbrio entre a reafirmação do seu poder económico e o reconhecimento de que, num mundo globalizado, a imposição de tarifas não substitui a necessidade de cooperação. Nesta batalha pela (re)centralização dos polos do comércio mundial, os EUA terão de navegar entre a necessidade de se “reerguer” – e repensar a sua dívida – e o risco de se tornarem um “mestre sem discípulos”, isolando-se numa economia cada vez mais interligada e multipolar.