Foi no ano passado que a AICC – Associação Industrial e Comercial do Café criou o selo «Portuguese Coffee – A Blend of Stories», como forma de dar a conhecer ao mundo a excelência do café português e de proporcionar às marcas nacionais um melhor acesso aos mercados internacionais. Em entrevista à DISTRIBUIÇÃO HOJE, Rui Miguel Nabeiro, dá-nos a conhecer o projeto e os seus objetivos.
Quais os objetivos da AICC e qual o seu posicionamento atual?
A Associação hoje tem alguns objetivos muito concretos e sobretudo dois pilares muito importantes. O primeiro deles é a marca do «Portuguese Coffee – A Blend of Stories». Criar o selo «Portuguese Coffee» é muito importante porque queremos aumentar as exportações de café português de todas as marcas que são associadas da AICC.
Claramente, o café português tem características que consideramos excecionais com potencial para ser reconhecido, não só pelos portugueses, mas também lá fora, como o melhor expresso. Nada como criarmos um selo que valorize o café português que tem um património cultural muito forte, que tem uma tradição nos hábitos de consumo em Portugal. No fundo, não foram só os torrefatores que o criaram mas também os consumidores, com o seu nível de maior exigência.
Portugal tem uma longa história ligada ao café. Se olharmos para trás, tudo o que são hoje os melhores produtores portugueses, são de ex colónias portuguesas. O maior produtor do mundo é o Brasil, e até há nem muitos anos atrás, o segundo maior, era Angola.
Continuamos a ter cafés muito bons em Timor Leste, em São Tomé e Príncipe… A AICC, há cerca de ano e meio, lançou este selo. Algumas marcas já começam a usá-lo no seu packaging e na sua identidade, o que consideramos muito importante para trazer essa história que é muito emocional, por um lado, mas também muito racional, porque o café português é reconhecido pelos portugueses, seja de que marca for. Este é o nosso primeiro grande pilar dentro da associação.
O segundo é claramente comunicar os benefícios do café para a saúde. Quer naquilo que foi comprovado no combate à demência, ao retardar do aparecimento de doenças, como a Parkinson e o Alzheimer, naquilo que diz respeito à diabetes, existem muitos estudos que começam hoje a aparecer a contradizer alguns mitos que existiam no passado.
Estes estudos são devidamente comunicados pela AICC pelos meios de comunicação social em Portugal…
É um aspeto muito valorizado pela AICC. A associação vive dos torrefatores. Quando detetamos alguma notícia ou um novo estudo científico internacional, naturalmente que temos de partilhar com o público. Existe uma perceção de que o chá é muito mais saudável quando também tem cafeína. O que as pessoas têm de perceber é que, como em tudo na vida, há que consumir com equilíbrio.
Que requisitos devem as marcas de café respeitar para a obtenção do selo «Portuguese Coffee»?
São requisitos muito simples. O «Portuguese Coffee» é um projeto dentro da AICC, temos sócios que quiseram aderir e outros que ainda não o fizeram. A primeira regra é ser associado da AICC. Em seguida, ter um lote de café torrado em Portugal. Quem coloca o selo tem de ser o detentor da marca e tem de aderir a um código de boas práticas que inclui obviamente tudo o que são normas de qualidade.
Para aderir ao selo, os associados têm de ter algumas normas básicas de segurança alimentar a cumprir. A marca é propriedade da AICC e os associados têm de cumprir com o manual de normas.
Aquele selo irá identificar que estas regras estão a ser cumpridas, e assegura ainda, do ponto de vista da qualidade de torrefação, da garantia do que é torrado em Portugal, que aquela é uma marca portuguesa e que cumpre com as normas / padrões já referidos.
O café pode ser considerado um dos produtos da saudade que liga os portugueses espalhados pelo mundo ao país de origem. Considera que o café também desempenha este papel de aproximação a Portugal para quem está a viver fora?
Naturalmente que o café é um vínculo forte para quem está a viver fora de Portugal e até para os que vão de viagem que, quando regressam, querem beber um café português. O que a AICC pretende é diminuir esse desejo para que o café possa crescer mais fora do nosso país.
É importante que os portugueses conheçam o selo pois pretendemos que sejam eles os primeiros embaixadores do «Portuguese Coffee» e que sejam exigentes com o café português. Isso é fundamental para que o mesmo possa crescer e para que este selo possa vingar.
Para os portugueses que vivem lá fora, pretendemos que tenham orgulho no que se faz em Portugal neste setor. Gostaríamos ainda que os turistas e as pessoas que moram noutros países, que possam ser alvo da presença de algumas marcas portuguesas nesses mercados, também as reconheçam como produtos diferenciadores.
O que diferencia o café português de outros?
Os portugueses são especialistas a fazer café expresso. O creme do café português é um creme diferente, que subsiste, que não desaparece, que tem aquele tom de avelã… Mas o segredo disto está, não só nas matérias-primas, ou seja, nos cafés que as torrefacções portuguesas escolhem e no seu mix entre arábicas e robustas, mas no processo de torra nacional e tradicional que existe em Portugal.
Continuamos a ter uma torra a temperaturas mais baixas, durante mais tempo. Este é o tipo de torra portuguesa, mais prolongada, o que permite que não fique demasiado queimado como em alguns casos internacionais onde o processo é desenvolvido em temperaturas mais altas e durante menos tempo. Nós continuamos a achar que esta torra é natural e traz benefícios no sabor, o que resulta num expresso diferente. Quando comparado com outro país que tem como referência expresso que é Itália, há uma diferença substancial no resultado.
Que iniciativas é que a AICC está a desenvolver para dar a conhecer este selo junto dos consumidores?
O selo aparecerá em todos os packaging das marcas que optarem por aderir. Paralelamente, vamos lançar uma grande campanha nesta fase antes do Natal com todas as marcas que aderiram, nos pacotes de açúcar que constituem o melhor e mais forte veículo de comunicação. Algumas marcas já têm saquetas na rua.
Quais as vantagens deste selo como oportunidade para os mercados internacionais?
Portugal tem crescido muito nas exportações. O «Portuguese Coffee» pretende que seja mais fácil para as marcas explicarem as características que estão por detrás desse café português quando estão lá fora. O que a AICC pretende é ajudar os seus torrefatores a identificar oportunidades no mercado.
Hoje, os mercados mais relevantes para o café português são destacadamente, a França, a Espanha e a Grécia. Naturalmente que a oportunidade passa por fazer crescer estes mercados, não só da Europa, como também fora dela.
Acreditamos que a marca é uma forma de irmos, em conjunto, expor o produto e reforçar a qualidade do café português. Pela experiência que as marcas vão tendo, ao nível da internacionalização, o potencial é enorme porque o consumidor gosta muito do produto.
Este é um setor que já tem um peso interessante na economia, e que emprega muitas pessoas, direta e indiretamente. Temos vindo a reforçar esta estratégia de internacionalização das marcas que não está dependente apenas dos ciclos económicos em Portugal, dá uma nova força ao setor, e acaba por criar uma sustentabilidade muito diferente a longo prazo para as empresas que o integram.
Esta foi a nossa visão: tentar perceber como podemos ajudar as empresas portuguesas do setor a serem mais resilientes nos momentos mais difíceis, e há que começar a procurar oportunidades, que as há, e são muitas. Fomos identificar o nosso ponto forte em comum e é a qualidade do nosso café português.
Que mensagem daria a marcas que ainda não estejam associadas à AICC e não tenham aderido ao selo?
Há que fazer parte deste projeto porque seguramente todos em conjunto somos muito mais fortes do que isoladamente. Há que trabalhar em conjunto para reforçar um produto em que todos acreditamos e com o qual todos trabalhamos para que também a notoriedade do café português possa crescer.
Sobretudo, é importante que os portugueses reconheçam esta diferenciação e possam ser os primeiros embaixadores da mesma. Estou certo que aqueles que ainda não se associaram nesta primeira fase o irão fazer porque irão reconhecer a mais valia que é ter um selo de café português, que valoriza este produto nacional, produzido por marcas e portuguesas, que dão emprego e que acrescentam valor à nossa economia. Diria que, se ainda não o fizeram, devem fazê-lo.
As maiores torrefatoras em Portugal estão presentes e acredito que até as mais pequenas que estejam agora a começar e que ainda não tenham um projeto de internacionalização concreto, podem beneficiar do selo «Portuguese Coffee» que reforça a sua identidade.