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Garrafeiras dão novo alento a bairros de Lisboa

Garrafeiras dão novo alento a bairros de Lisboa
O comércio tradicional está de volta. Isso é notório nas inúmeras lojas que estão a surgir nos bairros residenciais e que contrariam o verificado nas duas últimas décadas, em que se investiu maioritariamente em superfícies de grandes dimensões. Chegou-se inclusive a temer “a morte do comércio tradicional”.

Mas, a grande diferença face a anos anteriores, prende-se com o tipo de negócio. É certo que continua a existir as merceeiras de bairro, mas estão igualmente a aparecer outros conceitos. Como as garrafeiras. Estas não só refletem o recente interesse pelo mundo dos vinhos como atrai outro tipo de consumidores. Principalmente porque, este fenómeno ocorre fora das chamadas zonas tradicionais (ou mais apelativas) – diga-se, turísticas, mas também porque as garrafeiras realizam todo um conjunto de ações de promoção e divulgação do vinho. Em comum têm, todas elas, o fato de terem nascido de uma paixão. A paixão pelo vinho.

Wines 9297 – dar voz aos novos produtores

 

De uma “simples” consumidora para uma apaixonada e consequente abertura de uma garrafeira foi “um pulo” e um passo natural para Helena Pereira Muelle. O enceramento da loja de vinhos do bairro, assim como do incentivo dos amigos, levou Helena a equacionar aventurar-se numa nova área. Mas o risco era grande (mesmo porque a loja existente não vingou) pelo que a decisão passou pelo aluguer de um espaço mais pequeno, num horário a meio termo (Helena era e continua a ser investigadora, o seu trabalho principal). E assim, em Outubro de 2013, nasceu a Wines 9297.

Desde o início que Helena decidiu ter um posicionamento das outras garrafeiras do mercado, com imagem e clientes instituídos. Para tal decidiu apostar, maioritariamente, em novos produtores, mais pequenos e desconhecidos. É certo que isso dá mais trabalho, mas também aufere um grande desafio e prazer a Helena. E os resultados foram quase imediatos. Principalmente porque a decisão foi complementada com provas quinzenais, feitas pelos enólogos e com a possibilidade de adquirir os vinhos em prova com um desconto.

 

Isto, juntamente com o horário de abertura, e a localização, fazem com que o pico do fluxo de clientes ocorra ao fim da tarde (quando as pessoas regressam do trabalho) e ao sábado.

Inicialmente as provas eram gratuitas, mas recentemente (no início do ano) Helena decidiu alterar isso. A decisão baseou-se, por um lado, na elevada adesão face ao espaço disponível, mas também pelo aparecimento do fenómeno “caça provas” – pessoas que procuram informação sobre provas gratuitas de vinhos como forma de ter um início de fim-de-semana “regado”. Agora as provas mantêm-se, mas dependendo do pagamento de 5 euros, dedutível em compras (no próprio dia).

 

O valor é simbólico, mas serve de filtro. Apenas vêm à prova realmente quem está interessado. E, no fim, tendem a levar alguma coisa. “O que também é bom para o produtor”.

Mas só isto não chegava. Helena sentia a necessidade de realizar provas temáticas, de vinhos que já não constam do mercado… pelo que decidiu criar um Laboratório. Um espaço onde realiza provas especiais. Sejam provas verticais, provas só de uma casta, de vinhos mais valiosos, vinhos estrangeiros… Uma vez por mês, durante duas horas, o espaço recebe até 12 pessoas, com o valor a rondar os 20 euros por pessoa (dos quais 5 euros dedutíveis em compras). Complementarmente, embora de forma esporádica, e a pedido, Helena também realiza workshops.

 

Garrafeiras dão novo alento a bairros de Lisboa

O certo é que a Wines 9297 trouxe uma outra vida ao bairro de Telheiras. Mesmo porque neste momento uma grande percentagem dos seus clientes não reside no bairro. Ou seja, o seu grau de influência cresceu e ultrapassa o bairro.

Algés com Sabores – formação e prova como divulgação do vinho

Depois de 16 anos em provas Jorge Antunes decidiu a lançar a sua própria garrafeira. A escolha do local foi o mais fácil. Em Algés, local de residência de Jorge, onde este possuía um espaço, que se encontrava vazio. Uma pequena loja com uma gama de vinhos de topo e alguns produtos gourmet a complementar.

Em termos de divulgação o Algés com Sabores promove, todas as sextas-feiras, provas, gratuitas, na loja, devidamente promovidas na página de Facebook da loja. Adicionalmente, e fruto de uma parceira com o Luís Gradíssimo, são realizados, mensalmente, workshops e cursos de vinho. Os preços variam entre 60 a 90 euros, dependendo do nível e do tipo de vinho, para cursos de seis horas, num máximo de 12 pessoas. Para o futuro Jorge está a equacionar disponibilizar a venda online dos vinhos (e restantes produtos).

Para se diferenciar da concorrência o Algés com Sabor decidiu dar prioridade aos pequenos produtores (sem, no entanto, fugir ao standard de qualidade dos vinhos apresentados). Com a particularidade de ter produtos de todas as regiões, inclusive as ilhas. “Faço questão de ter os vinhos que marcam as várias regiões”.

A proximidade do Mercado de Algés, que sofreu obras de reabilitação cerca de 1 anos após a abertura do Algés com Sabores, em 2013, ajudou a revitalizar a zona da Baixa de Algés que, com o tempo, estava a “morrer”.

Mais do que apenas “vender” vinho a diferença deste tipo de lojas, como refere Jorge, passa pelo serviço personalizado, pela conversa associada, pela apresentação de vinhos “fora da caixa”. Mais do que isso. Jorge premeia alguns dos seus clientes com provas inusitadas. Diga-se, quando tem de experimentar novos produtores para decidir se estes integrarão (ou não) a gama da loja. É uma espécie de “miminho”, uma porta fechada ao final do dia, que serve de recompensa, mas também como prova de aferição para a aceitação desses vinhos.

Garrafeira Estado d’Alma de um corner no restaurante para quatro lojas

Tudo começou em 2011, com a abertura de um pequeno Bistrô, em Alcântara, com uma pequena garrafeira. Foi o suficiente para Tiago Cunha se aperceber do potencial do negócio. Resultado? Dois anos depois abriu a sua primeira garrafeira Estado d’Alma em Alcântara Rio. Para profissionalizar o negócio contratou-se o sommelier João Chambel que ainda se mantêm em funções.

Com o tempo o negócio evoluiu, apesar de a localização ser algo limitativa, em termos de espaço e de perfil de cliente. A solução? Encontrar um novo espaço. Depois de muito procurar, em 2016, Tiago encontrou, quase por acidente, a atual loja, na Avenida Alexandre Herculano, onde anteriormente existia um restaurante. No espaço de um mês o espaço foi transformado por completo.

E quando tudo parecia estar estável eis que, em Dezembro de 2016, surgiu a oportunidade de ficar com um espaço no Centro Cultural de Belém, onde existem garrafeiras desde os anos 90. Tiago admitiu que foi um risco. Mas tratava-se de uma oportunidade que não poderia perder. Não só por ficar mais perto do restaurante, de terem uma cafeteria no Centro Cultural de Belém, pela tradição de compra, mas também pelo perfil de cliente associado.

Com tudo isto, neste momento, a família tem quatro garrafeiras: em Alcântara, em Lisboa, no Centro Cultural de Belém e na Junqueira (ao lado do restaurante). Esta última tem a particularidade de, por um lado servir de apoio ao restaurante, e, por outro, de permitir que o cliente poder escolher qualquer referência e consumir o vinho, pagando 5 euros de taxa de rolha, no restaurante.

Em termos de divulgação a Garrafeira Estado d’Alma tem um posicionamento algo diferente. Embora façam, esporadicamente, MasterClass (ou provas onde as pessoas “prendem alguma coisa”, essa não é a sua principal ferramenta. E xx explica o porquê. No dia de inauguração da segunda garrafeira, onde haviam 8 produtores e um produtor de chocolate a apresentar os seus produtos, passaram pela loja cerca de 400 pessoas. Dessas a maioria nunca mais voltou à loja. São pessoas “que só vão a eventos, não trazem valor acrescentado nem ao produtor nem à garrafeira”.

Em tempo a garrafeira experimentou fazer uma prova com vinhos especiais (acima dos 90 euros) em que cobrava 10 euros por participação, dedutíveis em compras. Em resposta houve pessoas que afirmaram que não pagavam esse valor porque conseguiam ir a provas gratuitas. A questão não se prende com a participação das pessoas nas provas, mas sim com o retorno obtido, quer para o produtor como para a garrafeira. Não significa que a Garrafeira Estado d’Alma não faça provas. Apenas que define regras específicas para a as mesmas. O local escolhido será a loja do Centro Cultural de Belém, não só pelo espaço associado, mas também pela facilidade de estacionamento.

O proprietário da Garrafeira Estado d’Alma gostaria de apostar mais em eventos, nomeadamente jantares vínicos, mas depara-se com uma dificuldade: a de contratar pessoas qualificadas. Trabalhar numa garrafeira exige conhecimentos específicos e não há, ainda, no mercado pessoas em quantidade suficiente.

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