Embora o preço ainda seja determinante, já não é o único fator aquando da escolha de compra quando se fala nos produtos do reino de Baco. Hoje os consumidores valorizam mais o “preço relativo” e as edições limitadas.
Tradicionalmente, e durante muito tempo, o preço foi o fator mais decisivo no momento da aquisição de uma garrafa de vinho. Principalmente porque, em Portugal, facilmente se encontram bons vinhos, ditos do dia a dia, a preços muito apelativos. Mas será que ainda é assim? Que marcas e/ou regiões são os campeões de vendas em Portugal?
Não há uma única resposta a esta questão. Porque a mesma depende não só da estratégia de cada insígnia, mas também do poder de atração (e negociação) dos produtores e respetivas regiões.
No caso da Auchan, por exemplo, como explica Pedro Miguel Pinto, responsável de Compras na Auchan Retail Portugal, há três marcas consideradas como “um valor seguro”. Ou seja, que mais vendem. São elas a Porta da Ravessa, JP e Adega Vila Real. “Estão no nosso Top 5 de venda, quer em volume, quer em valor”, afirma Pedro Miguel Pinto. Já no caso da Makro, e dado o seu papel, mais vocacionado para empresas (onde se insere, por exemplo, a restauração), o resultado é ligeiramente diferente. Como refere Jorge Jerónimo, comprador de vinho da Makro, existem diversas marcas que dão conta da preferência dos consumidores, tendo em conta as ofertas por região e preço. No entanto o responsável acrescenta que, de uma forma geral “as marcas de valor seguro ou consagradas são as marcas dos principais produtores a nível nacional: Sogrape Vinhos, Cooperativa Agrícola Santo Isidro de Pegões, Casa Ermelinda Freitas, Herdade do Esporão, Quinta da Aveleda, CARMIM, Adega do Redondo, Adega de Borba, João Portugal Ramos, Adega de Monção, Adega de Vila Real, José Maria da Fonseca, Bacalhoa Vinhos, entre outros”.
Bom e barato
Mas há um outro fenómeno que ganha cada vez mais dimensão. O das marcas próprias. Veja-se o caso do Pingo Doce, que inclusive, convida enólogos para “dar a cara”, a determinados vinhos. E esta insígnia não é a única a optar por esta estratégia. O mesmo acontece com outras. A Makro, por exemplo, tem o vinho Insólito que, como constata Jorge Jerónimo, “tem vindo a conquistar a confiança do consumidor”.
A Mercadona é a insígnia mais recente no mercado português e afirma-se como tendo uma estratégia diferenciadora. Quando questionada Sofia Ribeiro, responsável Compras Vinhos da insígnia, afirma que a marca prefere apostar em “marcas próprias de vinho que são criadas pela Mercadona para o mercado português em colaboração com fornecedores portugueses e que respondem às necessidades que captámos a partir do consumidor”. E relembra que o “consumidor português é um grande adepto de vinho, sempre esteve presente na nossa cultura e tradição”. E foi precisamente esta tradição, acrescenta, que levou a Mercadona a apostar na criação de “uma gama de vinhos adaptada a Portugal”.
Apesar de ter, ainda, pouco tempo de existência no mercado nacional, e com um número limitado de lojas, localizadas na zona Norte do país, a resposta está, para já a corresponder às expetativas. “O feedback tem sido muito positivo, porque a nossa política, que está assente na transparência, permite ao consumidor identificar no rótulo o produtor português que faz a nossa marca própria de vinhos”, afirma Sofia Ribeiro, que acrescenta que o vinho “Meio Escudo”, marca própria da Mercadona, é produzido pelo produtor Quinta do Crasto.
Jorge Jerónimo tem uma perspetiva mais explicita da evolução do consumo. Mesmo porque o “consumo per capita que se destaca comparativamente aos restantes países”. É tradição que o vinho faça parte do cabaz habitual de compras. No entanto, refere o executivo da Makro, os “dados dos últimos anos têm sido positivos em termos de vendas, sendo de realçar um crescimento/aumento da procura de vinhos brancos rosés e espumantes face ao crescimento dos vinhos tintos”. A estes há ainda que acrescentar a valorização de vinhos de “nicho “e de diferenciação e edições limitadas.
Mas e em termos de região? Há alguma que se destaca? Sim, pelo menos no caso da Auchan. Segundo Pedro Miguel Pinto mais de metade dos vinhos vendidos na loja são tintos, sendo que esse peso aumentou no último ano. E aqui há que apontar, em destaque, o Alentejo e o Douro, que “representam cerca de 50% das nossas vendas valor”.
Esta referência é importante porque os dados indicam que o preço já não é o único fator a ter em conta no ato da compra. Hoje em dia, os consumidores prestam atenção (e têm em conta) outros fatores, como sendo a região, a ocasião ou a temperatura. Essa, pelo menos, é a visão da Auchan e da Mercadona. Aliás, como explica Sofia Ribeiro, a política da Mercadona é precisamente o de “garantir a qualidade dos produtos, mantendo um preço competitivo e mais constante”. Por outras palavras, a política da marca não assenta em promoções ou “oscilações constantes dos preços”. Como explica a responsável Compras Vinhos, a política comercial da marca é de ter “Sempre Preços Baixos, ou seja, preços estáveis e constantes, garantindo uma estabilidade ao longo de toda a cadeia de produção, permitindo que todos ganhem”.
Já Jorge Jerónimo, embora refira que o consumidor está mais atento, o “preço será sempre um fator determinante, influenciado sempre pelo poder de compra de cada um individualmente ou pela relação comparativa da oferta e a sua qualidade relativa”. E é aqui que entram regiões como Setúbal e Tejo, “que têm vindo a conquistar o mercado com produto de qualidade a um preço competitivo”. A exceção a esta perspetiva (do preço relativo) assenta nas edições limitadas, os chamados vinhos raríssimos ou exclusivos, “em que o valor e o preço não são o fator que determina a sua venda, sendo a disponibilidade, a valorização do produto e o serviço que suscita e faz a sua venda”.
Presença no linear
Estas mudanças na escolha e preferência do consumidor levam a alterações no linear. No momento de escolha de que vinhos a ter na loja já não basta olhar para o custo de aquisição. Hoje há mais “tipos” de consumidores e isso obrigada a uma outra gestão. Feita por categorias, no caso da Auchan, onde, como explica Pedro Miguel Pinto, são tidos em conta vários aspetos como o posicionamento de preço ou a origem do vinho/marca.
A Mercadona, por seu lado, tem uma abordagem muito específica. Começa por denominar de “Chefe” o seu cliente. E tentar conhecer os seus gostos e preferências. Só depois vai à procura, no mercado, do “melhor fornecedor que consiga oferecer a melhor solução, isto é, um fornecedor especialista que, juntamente com a Mercadona, desenvolve o melhor produto, garantindo sempre a máxima qualidade”. Parece simples, mas nada mais falso. O processo é circular e, como refere Sofia Ribeiro, funciona tendo por base provas cegas que confirma a escolha ou ajudam a melhor o processo. “Assim, podemos concluir que os nossos vinhos são desenvolvidos com e para os nossos ‘Chefes’”.
Tendo um cliente diferente a Makro opta por uma abordagem distinta, centrada nas “necessidades do nosso cliente, identificação de soluções para o seu negócio e seguimento das tendências de consumo do mercado concertado com a seleção e oferta dos produtores”.
Estratégias que, a par das dimensões das lojas, determinam o número médio de referências. A Makro, por exemplo, assume que tem um total aproximado de 1.500 referências, variando conforme a dimensão da loja e a sua localização. No entanto acrescenta que a estratégia passa, cada vez mais, por ter “uma oferta local que se aproxime cada vez mais da procura do nosso cliente”. Já a Mercadona assume a colaboração com 17 fornecedores de vinhos portugueses (das várias regiões), que asseguram as cerca de 70 referências existentes nas lojas. Mas este não é um valor estanque. Porque, como afirma Sofia Ribeiro, a Mercadona está constantemente a adaptar a sua oferta aos “Chefes”. “Se deles surgir a necessidade de outros vinhos, iremos à procura das melhores soluções para satisfazer essa necessidade”, acrescenta.
Nichos de mercado e Feiras de Vinho
No segmento dos vinhos há uma tradição e uma novidade. Por um lado, são já uma tradição as várias Feiras de Vinhos. Um momento onde há uma promoção de vinhos de todas as regiões e onde os consumidores tendem a aproveitar para renovar as suas “adegas”. Mas ainda será assim? A verdade é que, apesar de ainda serem importantes, têm vindo a perder peso. Pelo menos esta é a opinião de Pedro Miguel Pinto, que refere que apesar destas terem “cada vez menos peso no total de vendas do ano, fruto da forte pressão promocional existente no mercado, continuam a ser um momento importante para nós. É um momento onde disponibilizamos muitas novidades e algumas pequenas produções, e desafiamos os consumidores a experimentar estilos diferentes”. Opinião partilhada por Jorge Jerónimo que constata que o fator de elasticidade tem vindo a esbater-se. Mesmo assim as “Feiras de Vinhos continuam a ser um momento de destaque da categoria, as vendas nestes períodos sofrem um acréscimo pelo aumento do índice promocional, e por uma oferta diferenciadora com o lançamento de novos produtos, degustações e informação técnica para recrutar novos consumidores e tocar um número mais alargado de clientes”. Este “esbatimento” levou a uma “ligeira” alteração na estratégia da marca que optou por “ter uma oferta e preços competitivos 365 dias do ano”.
A novidade prende-se com o crescente interesse (dos consumidores) por edições limitadas e vinhos de nicho de mercado. É o caso, por exemplo, dos vinhos biológicos. Mas não só. Como refere Jorge Jerónimo, este é um ponto chave e a verdadeira “paixão” desta categoria, para além da expectativa do resultado das vindimas e qualidade da uva que nos conferem vinhos únicos ano após ano, vão surgindo novos conceitos como os vinhos biológicos, vinhos natura, vinhos Kosher, vinhos de talha, vinhos com submersão no rio e mar…tudo novos conceitos que são fatores de descoberta e de dinamização de vendas. “No caso concreto dos vinhos biológicos, apresentam um crescimento forte nos últimos anos, mas ainda com uma base pequena. De realçar, neste caso, a pouca oferta existente ao nível das marcas e da quantidade produzida, para além de um preço ainda inflacionado face aos vinhos correntes”, acrescenta. Pedro Miguel Pinto, por seu lado, acredita que “o aparecimento destes nichos de mercado é importante para a valorização da categoria”, acrescentando que “acreditamos que a sua importância vai crescer e refletimos isso nas nossas lojas, ao criarmos um espaço dedicado a produtos biológicos”. Já Sofia Ribeiro considera que (no caso dos vinhos biológicos) apesar de ser uma tendência de mercado ainda são considerados como um produto de nicho e com baixa procura. No entanto admite que possa crescer, “e até podem surgir novas tendências no mercado”.