Poderia ser só uma retrosaria mas é muito mais do que isso. A loja «Creative Stitches» é também uma escola de costura, um local onde se realizam workshops, ocupação de férias e festas de aniversário infantis, e onde se vendem presentes personalizados. A criatividade não tem limites numa viagem pelo empreendedorismo iniciada por Vânia Soares a partir do momento em que ficou desempregada.
À entrada, uma tenda em tecido recebe os clientes. Sobe-se um degrau e entra-se num mundo de cores e feitios. Tecidos para vários gostos, linhas, acessórios, roupas infantis inspiradas no universo infantil, mas também adereços para bebés, como porta chuchas, alcofas e babetes. A imaginação não tem limites e o rés do chão da «Creative Stitches», uma loja de artes&ofícios situada na vila de Oeiras, acaba por ser o resultado do que acontece no primeiro andar. Ao subir as escadas, deparamo-nos com várias máquinas de costura distribuídas numa mesa a servir de suporte para as aulas que acontecem regularmente. Os destinatários são todos os que gostariam de aprender aquela que era uma das profissões mais comuns de outras gerações. Uma espécie de regresso ao passado que torna a costura um ofício que ainda tem muito caminho para evoluir. Perto da sala de formação, uma janela a paredes meias com o edifício da Câmara Municipal de Oeiras, deixa avistar os carros que passam, no frenesim dos dias, opondo-se à calma e foco que se vive por ali onde um grupo de alunas começa mais uma aula e investe à procura do ponto perfeito e da criação ideal.
Depois de ter estudado psicologia clínica no ISPA [ Instituto Universitário de Ciências Psicológicas, Sociais e da Vida] e de ter exercido a profissão através dois estágios, um deles, relacionado com equitação terapêutica para autistas, e outro, na área de psicoterapia infantil, Vânia Soares trabalhou durante dez anos na área do turismo. «Foi uma experiência que não me arrependo de ter vivido», conta. Depois de a empresa onde trabalhava ter fechado, começou a pensar em alternativas e decidiu investir num negócio próprio. Assim surgiu, em julho de 2014, a «Creative Stitches». Foi um concretizar de um sonho.
Vânia sempre sentiu a necessidade de criar algo, na ânsia de inovar a cada dia, e o nascimento do filho Rodrigo trouxe-lhe ainda mais inspiração. «Sentia-me insegura e tímida relativamente ao que criava e depois de o meu filho ter nascido, comecei a colocar em prática algumas coisas que sempre imaginei.» Estava dado o mote para o que havia de vir.
A imagem da loja está assumida e sinto-me completamente segura de que conseguiria estar em qualquer parte do mundo com a minha marca”
«O meu filho costumava dizer, quando era mais pequeno, que a mãe trabalhava numa loja de atividades», partilha. É que a «Creative Stitches» é muita coisa num lugar só: realizam-se workshops de costura, com alunas que acompanham o projeto de há três anos para cá, ininterruptamente, há a possibilidade de os miúdos participarem no «costura kids» durante as férias e também é naquele espaço junto ao património histórico do concelho, que os pais podem realizar festas de aniversário originais em que as crianças costuram, e no final, elas próprias, experimentam o resultado do que criaram.
«Como estava desempregada e surgiam cada vez mais oportunidades de criar, a família incentivou-me e eu abri uma loja de crafs, de costura, algo muito generalizado, uma espécie de oficina onde poderia criar uma série de coisas», explica a responsável. Numa fase de indefinição sobre o que fazer no futuro, na altura em que ficou sem emprego, passou de carro junto ao espaço onde viria a abrir a loja, e reparou numa placa a dizer «Arrenda-se». Pensou de imediato que seria aquele o local onde viria a abrir o seu negócio com tudo o que isso implicaria. «Tive um grande suporte familiar mas é muito difícil ser empreendedor em Portugal», confessa. «O investimento inicial foi muito grande [ainda não foi recuperado] e com capital próprio. Eu tenho noção que vou ser responsável pelo meu sucesso ou insucesso. Quando preciso de alguma coisa, tudo acontece e consigo reunir um staff que me ajuda imenso», afirma. «As retrosarias e as lojas de tecidos implicam que se invista regularmente. Acontece o mesmo com as coleções. Tenho também muitos tecidos americanos e de outras origens internacionais na loja», acrescenta.
No ano passado, Vânia começou a idealizar a hipótese de criar coleções de roupa infantil por cada estação do ano. Entretanto, recebeu um convite por parte de uma editora para publicação da revista «Costurando» à venda em banca, totalmente idealizada si e com sessões fotográficas efetuadas para o efeito [cujo lançamento aconteceu em dezembro de 2017]. Em breve, será publicado o segundo número estando programadas mais duas edições até ao final deste ano.
A revista inclui alguns moldes para que os leitores possam replicar a coleção se assim entenderem, uma espécie de «Burda Style» aplicada a esta loja. «Acabo por ser eu a decidir as temáticas porque penso desde raiz, da meia ao acessório de cada coleção.»
«Esta loja tem algo muito interessante e se há algo que me faz lutar por este negócio é o facto de se inserir numa vila que está entristecida. As pessoas aproximam-se e investem neste projeto. Muitas vezes, sentem a loja como delas, o que faz com que a mesma avance», explica Vânia Soares. Neste momento, conta com a colaboração de Catarina Pimenta, formadora na área de costura, de Diana Soares, um ajuda essencial nas redes sociais, e pontualmente, com mais formadoras, como a Patrícia Abrantes, que se juntam ao projeto para levá-lo a bom porto.
Tive um grande suporte familiar mas é muito difícil ser empreendedor em Portugal”
Ao longo dos anos, Vânia foi criando também uma certa fidelização com os fornecedores que apoiam o projeto e a motivam para continuar. «A imagem da loja está
assumida e sinto-me completamente segura de que conseguiria estar com a minha marca em qualquer parte do mundo», assume.
Expandir? Talvez um dia
O facto de se ter formado em psicologia tem-lhe permitido alimentar algumas ideias que considera interessantes do ponto de vista da componente social e das atividades formativas. «Nas férias da Páscoa e do verão, temos um projeto intitulado “Costuras kids” que foi criada muito pela minha vertente de psicoterapia infantil e que permite ocupar as crianças de uma forma diferente. Elas costuram efetivamente e é muito engraçado de acompanhar o processo», conta. Tanto nesta área como nas festas de aniversário, valoriza o facto de estarem ocupadas de forma lúdica e de trabalharem a autoestima.
A Creative Stitches também está presente nas redes sociais, nomeadamente, no Facebook e no Instagram. Para os próximos meses, Vânia espera remodelar o site e apostar no e-commerce. «A nossa plataforma ainda não está como eu gostaria. O próximo passo vai ser melhorá-la, e embora já tenhamos pedidos de encomendas via redes sociais, tanto das coleções, como dos tecidos, vamos começar a vender online.»
A gerente já teve um convite para abrir a loja no Centro Comercial Colombo e surgiram outras hipóteses de a empresa crescer. «Era algo que gostava, não coloco essa possibilidade de lado, mas para já não posso equacionar esse passo dado o investimento que é necessário», explica.
E se, por um lado, gostaria de alargar o projeto para locais com mais visibilidade, num bairro como o de Campo de Ourique, em Lisboa, ou uma loja num shopping, confessa que vai ter imensa pena no dia em que tiver de sair do espaço de Oeiras. «Tem sido uma aposta pessoal e familiar muito grande», explica.
Não raras vezes, a loja sai das suas portas e participa em eventos fora, alguns deles, pro bono. A dedicação é a mesma e o empenho de Vânia segue consigo para o exterior. «Defendo totalmente a minha imagem e a minha marca. Levo tudo o que caracteriza a loja comigo replicando-a em vários eventos. Quem conhece, sabe que é a Creative Stitches que ali está», garante. Tudo é pensado ao pormenor.
A criatividade de Vânia estende-se aos presentes e vouchers personalizados que gosta de criar para cada cliente. Mais do que uma venda, aposta numa experiência única e diferenciadora. «Tenho muitas ideias e vou tentando colocá-las em prática.» Vânia é a prova de que o comércio local está bem vivo e pode marcar pela diferença.