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opinião

Pedro Pimentel: Optimismo em 2015, reticências para 2016

Pedro Pimentel

2015 trouxe-nos sinais de algum optimismo com o mercado do grande consumo a inverter, de certa forma, os maus resultados dos anos da Troika. Contudo, os desenvolvimentos das últimas semanas colocam o universo FMCG sob um manto de preocupação e perante muitas interrogações.

Por Pedro Pimentel, diretor geral da Centromarca

2015 trouxe-nos sinais de algum optimismo com o mercado do grande consumo a inverter, de certa forma, os maus resultados dos anos da troika. Contudo, os desenvolvimentos das últimas semanas colocam o universo FMCG sob um manto de preocupação e perante muitas interrogações.

A Deloitte, no seu estudo sobre as tendências de consumo para a época natalícia, refere, relativamente ao ano em curso, a “tímida evolução do consumo interno” e o facto que “os consumidores ajustaram o seu padrão de consumo, mostrando realismo face à evolução do contexto económico do país”, mas que, em simultâneo, parecem ter percebido que as “maiores dificuldades e desafios estarão ultrapassados”, encarando com algum otimismo o futuro próximo, sem, contudo, deixarem de manter uma forte prudência na alocação das suas despesas.

Olhando mais especificamente para o universo FMCG, 2015 mostrou para sinais bastante consolidados de retoma e dinamização neste mercado, sendo de recordar que em períodos de mais fortes dificuldades económicas, os sectores FMCG e, muito em especial, as categorias mais básicas tendem a mostrar significativa resiliência ao retrocesso do consumo. Por seu lado,  quando é sensível a recuperação da economia, se há sectores cujo consumo tende a disparar de imediato, no grande consumo a re-aceleração é bastante mais lenta. Assim, só a partir do início da Primavera o mercado FMCG começou a mostrar um crescimento mais sustentado e projeta-se para o final do ano um valor na casa dos 2%, que, apesar disso, não ilustra conveniente as realidades bem distintas que se observam numa análise categoria-a-categoria.

Só a partir do início da Primavera o mercado FMCG começou a mostrar um crescimento mais sustentado e projeta-se para o final do ano um valor na casa dos 2%, que, apesar disso, não ilustra conveniente as realidades bem distintas que se observam numa análise categoria-a-categoria.
 

 

Utilizando os dados do Barómetro Nielsen para a Centromarca, observa-se que a partir de Abril o mercado FMCG apresenta um crescimento sustentado que oscila entre os 2 e os 3%, com os supermercados de média/grande dimensão e, surpreendentemente, o comércio tradicional a mostrarem-se como os espaços comerciais com maior dinamismo. Todas as grandes famílias de produtos apresentam crescimentos (entre os 2 e os 5%), com a significativa exceção dos lacticínios (-2,6%), a que não parece ser alheia a polémica que nos últimos tempos tem sido associada ao seu consumo. As vendas de marcas de fabricante apresentam crescimentos na ordem dos 4%, enquanto as das marcas de distribuidor quebram quase 3%, em linha com que o que se vem observando desde 2013.

 

Em termos médios, o universo FMCG apresenta uma inflação próxima de zero face a 2014, mas uma análise mais atenta mostra uma quebra nos preços das marcas de fabricante em oposição a um ligeiro aumento nos das marcas de distribuidor, o que parece coerente com a lógica promocional sustentada nos produtos de marca.

O lado ‘negro’ do cenário atual é, no entanto, o contínuo aprofundamento promocional. Em cada 100 euros de compras, verificou-se no último um crescimento de 4 euros do valor dos bens comprados em promoção, de 29 para 33€. Se considerarmos apenas as marcas de fabricante, esse valor passou de 34 para 38€, atingindo os 41€ e 45€, respetivamente nas áreas da higiene pessoal e da limpeza caseira, onde praticamente um em cada dois euros é comprado em promoção. As promoções em dois quintos dos casos são de 50% (ou ainda mais) sobre os respetivos preços-base, gerando uma forte erosão das margens, quer de fabricantes, quer de retalhistas, destruindo as vendas-base e motivando a aposta no desconto imediato em detrimento de outras ferramentas promocionais. Não obstante, quatro em cada 10 promoções realizadas não geram qualquer aumento de vendas, nem do produto em causa, nem da categoria e, para além disso, quase 80% das promoções são compradas por apenas um terço dos consumidores.

 

Aproxima-se rapidamente 2016 e são muitos os desafios que se colocam a produtores e a retalhistas. Uns e outros, terão que começar a encarar mais seriamente as mudanças de paradigma que a demografia introduz. Por outro lado, o comércio digital, no mercado FMCG, é cada vez mais incontornável e esse será um fenómeno que muitas discussões motivará ao longo de 2016.

Por outro lado, o comércio digital, no mercado FMCG, é cada vez mais incontornável e esse será um fenómeno que muitas discussões motivará ao longo de 2016.

 

 

Os produtores devem aproveitar o cenário económico mais favorável para tentar recuperar o território das marcas: qualidade, comunicação, inovação e sempre de olho nas sinergias com os principais clientes. Devem reforçar a penetração no mercado HoReCa, beneficiando também do incremento do mercado turístico. E devem dar condições mais positivas aos clientes de menor dimensão e ao novo comércio de proximidade, reforçando a respetiva competitividade.

Do lado dos retalhistas, é necessário reinventar a experiência de compra, alargar o sortido, reforçar a qualidade e apostar na inovação. É preciso ouvir melhor a opinião dos consumidores e dar mais atenção a fatores como a escolha nos lineares, a portugalidade e a garantia de origem dos produtos que colocam no mercado ou a qualidade e apresentação das várias famílias de produtos frescos.

Para uns e outros será necessário desaprofundar a vertente promocional, sem que – apesar disso – o consumidor sinta que deixa de ser merecedor das suas atenções. As propostas de valor não deverão incidir, apenas e só, em reduções de preços e deve recordar-se que num mercado muito competitivo, a criatividade é fundamental para fidelizar o consumidor. E é necessário ter sempre presente que a conquista de quota é importante, mas pouco relevante num mercado em perda, pelo que a destruição de valor tem que ser estancada.

No entanto, paira uma sombra sobre todo este cenário de evolução que passa por perceber como reagirá o mercado às alterações que resultam da modificação do quadro político. E essa será, provavelmente, a maior interrogação que, nos próximos meses, ficará no ar…

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